Balazeiro rebate articulista e defende o trabalho decente em artigo na Folha


O procurador do trabalho Alberto Balazeiro publicou nesta quinta-feira (07/06), no jornal Folha de São Paulo, artigo rebatendo o articulista Leandro Narloch.

O jornalista havia declarado que o Ministério Público do Trabalho (MPT), ao exigir o respeito às leis trabalhistas, dificulta o avanço da economia. Alberto Balazeiro reafirma o conceito de trabalho decente e diz que o MPT quer fazer cumprir a normatização internacional do trabalho, aplicável aos países ricos e pobres.

O procurador, que atualmente ocupa o cargo de diretor adjunto da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU), aponta as contradições de Leandro Narloch que, em seu discurso, defende que a reforma trabalhista abriria as portas para a geração de empregos. Além do aumento do desemprego, aponta Balazeiro, a nova legislação precariza as condições de trabalho.

Leia na íntegra o artigo de Alberto Balazeiro:

Precisamos de trabalhos degradantes?

Em artigo publicado nesta Folha, em 16 de maio, Leandro Narloch sustenta, em síntese, que, embora movido por boas intenções, o Ministério Público do Trabalho agiria contra pilares da ciência econômica, gerando maior exclusão a partir da exigência de melhores condições de trabalho. Analisa ações do MPT, a título de exemplo, qualificando como condições análogas às de escravo trabalhadores que recebiam R$ 4 para descascar 200 quilos de mandioca.

Em tempos de reforma trabalhista, mesmo com a névoa da falsa geração de empregos que adviria da nova legislação já se dissipando com o recorde de queda na assinatura de CTPSs no primeiro trimestre de 2018, vale lembrar que o conceito de trabalho decente não foi inventado pelo legislador brasileiro.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) adota essa terminologia para se referir a um patamar mínimo de condições em que o labor pode ser prestado, tanto em relação à preservação da segurança e saúde do trabalhador quanto no tocante à idade mínima para prestação e remuneração condizente, sendo parte de inúmeras convenções internacionais das quais o país é signatário. Tem-se, assim, que o Ministério Público brasileiro quer fazer cumprir apenas a normatização internacional, aplicável a países ricos e a países pobres, como o nosso.

O mesmo conceito de trabalho digno se associa a outro, igualmente basilar, de que assegurar a sua existência é romper com o ciclo intergeracional da pobreza. As bengalas de trabalhos miseráveis impedem que os pais deem oportunidade a seus filhos de melhores condições de educação. Quantos de nós ouvimos falar que seria melhor trabalhar na infância do que estar envolvido no crime, como se ao filho do pobre se relegassem apenas e tão somente essas duas opções?

Desnuda-se, assim, o primeiro grande furo de um discurso de fragilidade evidente: a culpa da exploração desavergonhada da miséria não é do explorador, muito menos do governante omisso e leniente nas políticas públicas de inclusão no trabalho digno, mas sim daquele que faz ceifar a prática para exigir a implantação dessas políticas.
E nem a economia socorre o articulista. De logo, derrapa ao nem sequer analisar que o trabalhador mais bem remunerado também será um consumidor com melhores condições de movimentar o giro econômico. Não há mercado sem consumidor.

E por falar em mercado, a noção de ética em economia também, pasmem, infelizmente, não é ideia nossa. E é nesse ponto que o escorregão é maior. Os países desenvolvidos rejeitam produtos manchados pela nódoa da cadeia suja, pressão mundial para que bens oriundos de países que têm a degradação do trabalho na base de produção não sejam comercializados. Fugir de chavões diante de uma ideia articulada com tamanha carga de equívocos e textos preconcebidos não é tarefa fácil. Mas é impossível fugir da tentação de se recordar que o homem não é mercadoria, nem mesmo que se considerasse que o pobre Adam Smith (1723-1790) assim teria desejado.

Então, afinal, precisamos de trabalhos degradantes? Sem exclusão das responsabilidades — penais, inclusive, se for o caso —; dos simuladores e incitadores; e do grande caldeirão político em que se transformou a paralisação que tanta preocupação levou aos brasileiros nos últimos dias, o certo é que caminhoneiros submetidos a jornadas de 12 horas diárias, nos termos da recente Lei 13.103/2015, parecem entender que não.

Um debate tão raso como esse —se devemos flexibilizar direitos mínimos sob a falsa premissa de que exigi-los extingue oportunidades— traz a lume, em realidade, um questionamento que por vezes é repetido, mas em sua essência ignorado: que país, de fato, queremos? Com certeza não aquele que faça dos miseráveis o motivo para que continuem a ser explorados. Não ao menos com o beneplácito do Ministério Público do Trabalho.

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