Campanha alerta para risco de aumento do trabalho infantil durante a pandemia

Com o slogan “Covid-19: agora mais do que nunca, protejam crianças e adolescentes do trabalho infantil”, Ministério Público do Trabalho (MPT), Justiça do Trabalho, Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Fnpeti) lançam hoje (03/06) a campanha nacional sobre a necessidade de proteção a esta parcela da população.

O objetivo é chamar a atenção da sociedade e dos gestores públicos federais, estaduais e municipais para a necessidade de aprimoramento de medidas de prevenção e de combate ao trabalho infantil, em especial diante da vulnerabilidade socioeconômica resultante da crise provocada pelo novo coronavírus. A ação institucional conta com o engajamento de artistas e especialistas no assunto.

Os rappers Emicida e Drik Barbosa vão disponibilizar na semana que vem, dia 9 de junho, música inédita sobre o tema, intitulada "Sementes", nos aplicativos de streaming. Um videoclipe da faixa chega, na mesma data, ao canal no Youtube de Emicida. Também serão publicados nas redes sociais vídeos com histórias reais de vítimas, com o título “12 motivos para a eliminação do trabalho infantil”, dentre outras publicações coordenadas em toda a rede de proteção, como cards, reportagens, podcasts entrevistas e as lives ou webinares, como são chamadas as palestras e debates nas plataformas digitais.

No Dia Internacional de Combate ao Trabalho Infantil, 12 de junho, haverá um webinar transmitido pelo canal do Tribunal Superior do Trabalho no Youtube. O evento conta com o apoio e participação do Canal Futura e vai debater questões como o racismo no Brasil, os aspectos históricos, mitos, o trabalho infantil no contexto da Covid-19 e os desafios da temática pós-pandemia. As ações continuam durante o mês de junho nas redes sociais das instituições parceiras.

Trabalho infantil – A Bahia é o oitavo estado do país com maior percentual de trabalho na infância e na juventude. seu trabalho explorado ou que precisam de seu trabalho para suprir suas necessidades. São 252 mil crianças e jovens, o que representa 7,7 da população do estado nessa faixa etária que trabalham. O quadro anterior à pandemia preocupa ainda mais os especialistas no assunto, que temem que a informalidade agrave ainda mais a situação socioeconômica dessa parcela da população, que não acessa programas de auxílio do Estado.

“O Estado não se importa com o valor prospectivo da infância e juventude, como portadoras da continuidade do seu povo”, alerta a procuradora Ana Maria Villa Real, coordenadora nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância), do MPT. Para ela, “o princípio da proteção integral é o único caminho para se chegar a uma vida adulta digna; não há atalhos para isso! Crianças e adolescentes têm direito à dignidade, a florescerem e a crescerem com as vivências próprias de suas épocas. Não há dignidade pela metade. Dignidade é inegociável”, completa.

Ainda está em andamento no Brasil o processo de erradicação do trabalho infantil tanto o de exploração por alguém quanto o de autoconsumo, quando a criança ou adolescente contribui com seu trabalho para sobrevivência da família. No último grande painel à disposição, a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (Pnad) de 2016, são investigadas as características de trabalho das pessoas de 14 anos ou mais de idade e, em caráter suplementar, das pessoas de 5 a 13 anos. Mais de 2,4 milhões de pessoas (5,9% da população nessa faixa etária, que era de 40,1 milhões) trabalhavam em 2016, realidade que sofreu poucas transformações até aqui.

Cenário mundial - De acordo com a OIT, antes da disseminação da Covid-19, quase 100 milhões de crianças haviam sido resgatadas do trabalho infantil até 2016, reduzindo o número de 246 milhões em 2000 para 152 milhões, segundo a última estimativa global divulgada. A fim de evitar um aumento dessa estatística em 2020 e perseguir a meta de erradicar essa violação até 2025, a campanha mundial faz um chamamento aos países para que incrementem políticas públicas de proteção visando assegurar os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, inclusive o direito ao não trabalho.

O diretor do escritório da OIT no Brasil, Martin Georg Hahn, destaca que a pandemia e a consequente crise econômica e social global têm um grande impacto na vida e nos meios de subsistência das pessoas. “Para muitas crianças, adolescentes e suas famílias, a crise significa uma educação interrompida, doenças, a potencial perda de renda familiar e o trabalho infantil”, explica. Para Martin Hahn, é imprescindível proteger todas as crianças e adolescentes e garantir que eles sejam uma prioridade na resposta à crise gerada pela Covid-19, com base nas convenções e recomendações da OIT e Convenção das Nações Unidas.  “Não podemos deixar ninguém para trás”, acrescenta.

Afeta a sociedade - De acordo com a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Kátia Arruda, coordenadora do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo a Aprendizagem da Justiça do Trabalho, “está na hora de compreender que toda criança é nossa criança e o mal que se faz com a exploração do trabalho infantil afeta toda a sociedade, com grave repercussão no nível educacional, no desenvolvimento físico e psicológico e, principalmente na qualidade de vida desses meninos e meninas. É preciso que o exercício de direitos e de solidariedade comece pela proteção de nossas crianças e jovens”, disse.

Os números do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde mostram o quanto o trabalho precoce é nocivo: entre 2007 e 2019, 46.507 crianças e adolescentes sofreram algum tipo de agravo relacionado ao trabalho, entre elas, 279 vítimas fatais notificadas. Entre as atividades mais prejudiciais, está o trabalho infantil agropecuário: foram 15.147 notificações de acidentes com animais peçonhentos e 3.176 casos de intoxicação exógena por agrotóxicos, produtos químicos, plantas e outros.

Estudo publicado no dia 25 de maio pelo Fnpeti revela ainda que mais de 580 mil crianças e adolescentes de até 13 anos trabalham em atividades ligadas à agricultura e à pecuária, que estão na lista das piores formas de trabalho infantil. A pesquisa teve como base o Censo Agropecuário de 2017, divulgado pelo IBGE em 2019. Apesar da redução obtida desde 2006, quando o número era de mais de um milhão, com a Covid-19, o trabalho infantil agropecuário também pode voltar a crescer. Para a secretária executiva do Fnpeti, Isa Oliveira, a luta contra o trabalho infantil apresenta desafios ainda maiores no contexto da pandemia. “Crianças e adolescentes estão ainda mais vulneráveis, o que exige do Estado brasileiro medidas imediatas e eficazes para protegê-las do trabalho infantil e proteger suas famílias”, ressalta.

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